Glosas médicas: saiba o que é e como evitá-las
Saiba mais sobre os principais tipos de glosas, como evitá-las ou como recorrer e corrigir o apontamento feito pela operadora.
Médicos, clínicas, laboratórios e hospitais convivem com um problema crônico para sua saúde financeira: as glosas médicas. O não pagamento por parte das operadoras de saúde por procedimentos, internações, exames, entre outros serviços, gera impacto negativo não apenas no fluxo de caixa, mas também leva a perda de muito tempo com transtornos burocráticos, desgastando o relacionamento entre os médicos e as empresas.
A glosa nada mais é do que quando as operadoras de planos de saúde deixam de pagar por atendimentos já realizados ou medicamentos e materiais fornecidos1. O problema é antigo e ainda segue recorrente. Em 2010, uma pesquisa da Associação Paulista de Medicina (APM) e Datafolha apontava que, para 78% dos médicos ouvidos, a glosa de procedimento era a principal interferência das operadoras na autonomia profissional2.
Passados 12 anos, o levantamento3 feito pela Associação Médica Brasileira (AMB) e APM com 3.043 profissionais de todo o país, entre 25 de fevereiro e 9 de março deste ano, trouxe que 8 em cada 10 médicos que atendem pacientes por planos de saúde afirmam ter sofrido restrições de operadoras ao prescreverem exames de laboratório ou de imagem.
Nessa pesquisa divulgada no final de março, 85,8% dos médicos entrevistados relataram sofrerem glosas, sendo que desses 52% comentaram que as glosas ocorrem às vezes e 33,8% comentaram que são “glosados” com frequência.3
Além disso, a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS)4 mantém em sua página na Internet o Painel de Indicadores de Glosas, em que é possível consultar o percentual das rejeições de pagamentos e a demora de cada operadora. Em 2021, por exemplo, o tempo médio para um plano efetuar o pagamento ao prestador de serviço foi de 32,97 dias. A glosa inicial foi de 7,5% e a final, de 5,93%. Do total de guias emitidas, 13,82% não tiveram retorno após 60 dias de cobrança.4
Tipos de glosas
De acordo com o guia “Orientações aos médicos sobre os requisitos mínimos para a contratualização com operadoras de planos de saúde”5, da AMB e do Conselho Federal de Medicina, existem tipos diferentes de glosas.
Glosas técnicas
As glosas técnicas6 são suspensões de pagamento relacionadas às justificativas técnicas e indicação clínica para a realização dos procedimentos, quanto ao uso dos materiais médico-hospitalares, sobre prescrição de medicações e de terapias específicas (por exemplo, diálise, fisioterapia, quimioterapia). Também sobre o uso e permanência de instalações hospitalares, como centro cirúrgico.5
Elas são mais comuns no ambiente hospitalar, durante internações e ocorrem muitas vezes por/pela:
- Ausência ou descrição incompleta de procedimentos no prontuário do paciente;
- Problemas de cadastro do paciente;
- Desatenção no registro de medicamentos utilizados e falta de checagem com o nome e registro do profissional responsável pelo atendimento.
Glosas administrativas
Já as glosas administrativas são as mais comuns. Elas se referem ao não pagamento por motivos relacionados aos itens estabelecidos em acordos prévios, como elegibilidade do beneficiário, procedimento não acordado ou não autorizado, prazos e valores estabelecidos.5
Elas podem ser causadas por/pela:
- Comunicação ineficiente entre o prestador e o plano de saúde6;
- Falta de dados ou de documentos exigidos pelas operadoras; e
- Erros de digitação ou de escrita em datas, códigos ou valores em desacordo com o convênio;
- Registro das guias de autorização médico-hospitalares feito de modo inadequado.
Glosas lineares
Há também as glosas lineares6, que são referentes a estabelecidas nos contratos de cada convênio. Para evitá-las a atenção deve ser redobrada quanto aos processos de pagamento, indicadores operacionais e sistemas de faturamento.
Fique atento!
Ao se firmar uma parceria com uma operadora, o médico deve estar atento a alguns itens de contrato. As operadoras, por exemplo, não podem estabelecer regras que impeçam o acesso do prestador às rotinas de auditoria técnica ou administrativa, bem como o acesso às justificativas das glosas. Também não podem conter cláusulas que impeçam a contestação das
Como evitar a glosa
É possível evitar a ocorrência de glosas ou diminuir sua incidência com algumas ações e mudanças de gestão dentro da clínica ou no dia a dia do consultório6.
Uma delas é a organização de dados. Como cada operadora possui regras específicas, é necessário elaborar um checklist das informações que devem constar em cada etapa do atendimento, antes de mandar o faturamento para a empresa. Pode ser, por exemplo, uma tabela digital, com as regras gerais e específicas de cada operadora e os mecanismos que deverão ser utilizados para cada caso de glosa.6
Há a opção de se contratar um software de gestão. Além de tornar o trabalho mais ágil e eficiente, digitalizar processos administrativos auxilia na redução da possibilidade de falhas operacionais que podem causar glosas.
Os colaboradores, como atendentes e auxiliares, precisam estar capacitados para operar esses programas de tecnologia e também atentos às normas da ANS e de cada operadora que a clínica, consultório ou hospital trabalha. Por isso, investir na capacitação desses funcionários é muito importante. Ao entender as etapas do relacionamento com os planos de saúde, como funcionam os programas de digitalização de dados e como atua cada operadora, esses funcionários poderão antever onde os potenciais problemas de burocracia e o que fazer para saná-los, reduzindo, assim, o número de glosas.
Tornar o processo de faturamento mais eficaz é a melhor maneira de prevenir as glosas, especialmente em clínicas e hospitais, onde o fluxo de pacientes é maior e o número de operadoras de planos, também. Adotar processo de indicadores de desempenho, produtividade e finanças é uma boa maneira de identificar os principais fatores que causam as glosas e propor soluções. Por exemplo, fazer um levantamento de tudo que foi glosado nos últimos meses, mapear suas causas e elaborar um plano para solucionar esses problemas. Em seguida, analisar o resultado nos meses seguintes, para avaliar o sucesso desse planejamento e readequar os pontos necessários.
Também é importante realizar auditorias internas regularmente, analisando processos internos e prontuários médicos, verificando se os valores orçados estão de acordo com os procedimentos que foram realizados. Assim, caso haja erros, será mais fácil localizar suas origens e resolver o problema.
Como recorrer
Ao ser glosado, o médico ou o estabelecimento de saúde tem o direito de contestar e entrar com recurso na operadora do plano7.
O recurso de glosas é a oportunidade de corrigir o erro apontado pela operadora ou contestar o apontamento feito. De modo geral, as operadoras disponibilizam as informações sobre os pagamentos em demonstrativos de contas médicas, para o processo de conciliação dos créditos.
Os analistas de conciliação (lado do prestador) acessam o site do convênio, baixam estes demonstrativos e conferem as contas, para identificar as glosas.
Quando uma é identificada, o prestador pode realizar o recurso, pedindo à operadora para reconsiderar a cobrança glosada.
O primeiro passo é identificar se a glosa foi de ordem técnica, administrativa ou linear, para saber onde foi o erro e se preparar para buscar a solução. Em seguida, reúna documentos que possam embasar o recurso, como guias assinadas, autorizações e pedidos de exames.
Ao efetuar o recurso no sistema das operadoras, muitas delimitam o espaço de descrição a uma quantidade determinada de caracteres. É preciso saber usar esse espaço de maneira eficiente, evitando repetições de dados que constem nos documentos a serem anexados e inserindo o máximo de informações pertinentes ao caso.
É preciso ficar atento aos prazos limites para a entrada de recursos e ao padrão que cada uma estabelece para o envio dessas informações.
Uma das queixas dos médicos com relação às operadoras mencionados na pesquisa da AMP33é demora na resposta com relação às glosas. A ANS em reportagem publicada pela Agência Brasil1 afirmou que todas as reclamações registradas geram notificação à operadora para apresentar sua defesa, analisando a situação dentro do prazo legal.
Conforme a ANS, parte das denúncias é arquivada com sua resolução. Já as que prosseguem sem solução são encaminhadas para outros setores da agência para que sejam analisadas questões assistenciais e econômico-financeiras das operadoras que poderiam motivar tal conduta.
Para evitar perda de tempo e dor de cabeça, médicos, consultórios, clínicas, hospitais acabam até contratando empresas especializadas na gestão de empresas de saúde e de enfrentamento de glosas.
Referências
1-Agência Brasil. Medo de represália desencoraja médicos a denunciarem planos à ANS. Última atualização: 11/04/2022. 2-Cremesp. Glosa de procedimentos. 3-AMB. Pesquisa os médicos brasileiros e os planos de saúde. 4-ANS. – Painel de Indicadores de Glosa. 5-Orientações aos médicos sobre os requisitos mínimos para a contratualização com operadoras de planos de saúde. 6-Saúde Business. Glosas médicas: o que pode estar errado com os processos internos? Última atualização: 22 Mar, 2022. 7- Glosa Médica: o guia completo.