O papel do farmacêutico como agente de imunização nas farmácias
Nathália Christino Diniz Silva
CRF-SP nº 50.341
Farmacêutica
Pós-graduada em Farmacologia Clínica e
Gestão Estratégica de Pessoas: Desenvolvimento Humano de Gestores
As vacinas estão entre as principais conquistas da humanidade1 e a imunização é reconhecida como uma das intervenções de saúde mais bem-sucedidas do mundo².
No Brasil, na década de 1970, foi instituído o Programa Nacional de Imunizações (PNI), com o objetivo de coordenar as ações de imunização no país3. O PNI é responsável por definir o Calendário Nacional de Vacinação do Sistema Único de Saúde (SUS), com orientações para cada fase da vida e para os povos indígenas, considerando aspectos como situação epidemiológica, risco, vulnerabilidade e especificidades sociais4. Desde 2014, com a publicação da Lei Federal no 13.021, as farmácias foram autorizadas a dispor, para atendimento imediato à população, de medicamentos, vacinas e soros que atendam ao perfil epidemiológico de sua região demográfica5.
Em 2017, a fim de definir os requisitos mínimos para o funcionamento dos serviços de vacinação humana, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) publicou a Resolução de Diretoria Colegiada (RDC), no 1976 e, no ano seguinte, com o objetivo de definir os requisitos necessários à prestação do serviço de vacinação pelo farmacêutico, foi publicada pelo Conselho Federal de Farmácia (CFF) a Resolução no 6547.
Para realizar o serviço de vacinação, o estabelecimento deve estar licenciado para essa atividade pela autoridade sanitária competente e inscrito no Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde6. Em relação à infraestrutura, deve dispor de instalações físicas adequadas às atividades de vacinação, de acordo com a RDC da Anvisa no 50/2002 (ou regulamentação que venha a substituí-la)6 e normas estaduais e municipais relacionadas ao assunto, a fim de cumprir também as exigências locais8. Além disso, o estabelecimento deve ser dotado, no mínimo, dos itens obrigatórios citados na RDC da Anvisa no 197/2017, como área de recepção separada da sala de vacinação, sala de vacinação com pia, bancada, caixa térmica de fácil higienização, equipamento de refrigeração regularizado perante a Anvisa exclusivo para guarda e conservação de vacinas (com termômetro de momento com máxima e mínima), recipientes para descarte de materiais perfurocortantes e de resíduos biológicos6.
Para realizar o serviço de vacinação, a Anvisa estabelece que o estabelecimento deve ter ao menos um responsável técnico e um substituto6. No caso das farmácias, esses profissionais são farmacêuticos e, de acordo com o CFF, é obrigatório que haja farmacêutico apto a prestar o serviço de vacinação durante todo o período de funcionamento do estabelecimento que oferece o serviço7. Para ser considerado apto a prestar o serviço de vacinação, o profissional deve cumprir os requisitos da Resolução da CFF no 654/2018, sendo recomendado ainda que realize curso de suporte básico de vida e, no mínimo, atualização anual relativa aos conteúdos teóricos afins ao serviço de vacinação pelo farmacêutico e ao PNI7.
Em local visível ao usuário, deverão ser afixados o Calendário Nacional de Vacinação do SUS6 e a declaração emitida pelo Conselho Regional de Farmácia (CRF) que ateste a identificação do farmacêutico e sua aptidão para a prestação do serviço de vacinação7.
Entre as atribuições do farmacêutico no serviço de vacinação, descritas na Resolução do CFF no 654/20187, pode-se destacar: elaborar procedimentos operacionais padrão; notificar às autoridades a ocorrência de incidentes, eventos adversos pós-vacinação e queixas técnicas; fornecer ao usuário a declaração do serviço prestado; registrar as informações no cartão de vacinação, no sistema de informação definido pelo Ministério da Saúde e no prontuário individual do usuário; enviar à Secretaria Municipal de Saúde, mensalmente, as doses administradas segundo modelos padronizados; elaborar Plano de Gerenciamento de Resíduos de Serviços de Saúde relacionado à prestação do serviço de vacinação.
Além dos requisitos para regularização do serviço de vacinação e competências profissionais, é imprescindível que o farmacêutico tenha conhecimento dos aspectos técnicos referentes à vacina (tipos de vacina, apresentação, esquema vacinal, calendários de vacinação do SUS e da Sociedade Brasileira de Imunizações [Sbim]), bem como responsabilidades e procedimentos a serem seguidos antes, durante e após a sua administração (incluindo formas de manuseio, técnicas e vias adequadas a aplicação, notificação, conservação, armazenamento, transporte e gerenciamento de resíduos gerados). São apresentadas a seguir algumas informações importantes sobre aspectos técnicos referentes à vacina e à sua administração.
As vacinas são “medicamentos imunobiológicos que contêm uma ou mais substâncias antigênicas que, quando inoculadas, são capazes de induzir imunidade específica ativa, a fim de proteger contra, reduzir a severidade ou combater a(s) doença(s) causada(s) pelo agente que originou o(s) antígeno(s)”6. De acordo com a composição, são classificadas como atenuadas (vivas) ou inativadas (não vivas)1,8, podendo ser apresentadas na forma isolada, combinada ou conjugada8, cabendo ao farmacêutico atentar-se às particularidades e às diferenças entre elas, a fim de garantir a segurança do usuário. Por exemplo, as vacinas atenuadas, geralmente, não precisam de dose de reforço, pois conferem imunidade em longo prazo, sendo contraindicadas a imunocomprometidos e gestantes, enquanto as vacinas inativadas são mais seguras para esse público e necessitam de reforços para induzir a imunidade1,8.
Além disso, é importante que o farmacêutico analise os intervalos mínimos recomendados para a aplicação das vacinas, de acordo com as suas características, bem como os fatores que podem influenciar a resposta imune, que estão relacionados ao vacinado (exemplos: idade, gestação, amamentação, imunocomprometimento) e/ou à vacina (exemplos: via de administração, dose e esquema de vacinação, adjuvantes)8.
Antes da administração da vacina, o farmacêutico deve realizar o acolhimento da pessoa a ser vacinada e, por meio da anamnese, identificar necessidades e problemas de saúde, bem como fatores de risco e condições que possam contraindicar alguma vacina ou exigir medidas específicas. O profissional deve, ainda, avaliar o histórico de vacinação, analisar a prescrição médica (quando couber) e identificar e definir quais vacinas podem ser administradas7,8.
Vale destacar que as farmácias privadas podem disponibilizar à população as vacinas do Calendário Nacional de Vacinação do SUS, além daquelas que constam no calendário da Sbim8. Para a administração de vacinas que não estejam contempladas no Calendário Nacional de Vacinação do SUS, será necessária a apresentação de prescrição médica6.
Para estabelecer o procedimento a ser adotado para a administração da vacina selecionada, o farmacêutico deve observar a via indicada (oral ou parenteral) e a forma farmacêutica na qual a vacina é apresentada (bisnaga, ampola, frasco-ampola ou seringa preenchida). Posteriormente, deve selecionar os materiais e separá-los, preparar a dose utilizando o procedimento adequado, administrar a vacina empregando técnica apropriada e realizar descarte dos resíduos. Cabe ressaltar que os resíduos gerados no serviço de vacinação pertencerão aos grupos A (subgrupo A1), D e E, devendo-se verificar o manejo adequado conforme o grupo8.
O farmacêutico deve higienizar as mãos antes e depois de manusear as vacinas, administrá-las e executar qualquer atividade na sala de vacinação8.
As farmácias devem garantir atendimento imediato às possíveis intercorrências relacionadas à vacinação e, se necessário, encaminhar o usuário a outro profissional ou serviço de mais complexidade6.
É fundamental que o farmacêutico realize orientação sobre os cuidados e as precauções relativos à vacinação, possível ocorrência de eventos adversos pós-vacinação e necessidade de retorno para administração da dose seguinte, quando houver8. Ainda, o profissional deve esclarecer dúvidas e atuar contra a disseminação de informações falsas, aumentando a conscientização sobre a importância e benefícios da vacinação.
Considerando a extensão do assunto, foi apresentada aqui uma síntese das principais informações referentes à vacinação, cabendo ao farmacêutico se manter atualizado tanto em relação ao conteúdo técnico quanto ao legal.
Ao disponibilizar o serviço de vacinação, as farmácias auxiliam na ampliação da cobertura vacinal e os farmacêuticos ganham destaque enquanto profissionais preocupados com a prevenção de doenças e a promoção da saúde da população.
Referências bibliográficas: 1. Ballalai I, Bravo F (org.). Imunização: tudo o que você sempre quis saber. Acesso em: 10 nov 2020. 2. World Health Organization. Immunization coverage. Acesso em: 10 nov 2020. 3. Ministério da Saúde. Sobre o programa. Acesso em: 10 nov 2020. 4. Ministério da Saúde. Programa Nacional de Imunizações. O que é? Acesso em: 10 nov 2020. 5. Brasil. Lei no 13.021/2014, que dispõe sobre o exercício e a fiscalização das atividades farmacêuticas. Acesso em: 10 nov 2020. 6. Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Resolução de Diretoria Colegiada no 197/17, que dispõe sobre os requisitos mínimos para o funcionamento dos serviços de vacinação humana. Acesso em: 10 nov 2020. 7. Conselho Federal de Farmácia. Resolução no 654/2018, que dispõe sobre os requisitos necessários à prestação do serviço de vacinação pelo farmacêutico e dá outras providências. Acesso em: 10 nov 2020. 8. Conselho Regional de Farmácia do Estado de São Paulo. Projeto Farmácia Estabelecimento de Saúde _ Fascículo XIII: Cuidado farmacêutico em vacinação. Acesso em: 10 nov 2020.